quarta-feira, 7 de março de 2018

Tristes notas Marianas - 1


Quem foi ao Pará, parou. Tomou açaí e chorou.
Com os recentes acontecimentos em Barcarena, no Pará, de mais uma contaminação de massas de água por problemas em bacias/barragens de contenção de resíduos de mineração, vejo-me na obrigação de colocar neste blog algumas anotações que já vinha fazendo desde o rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana.

Sobre o recente incidente no Pará:
Vazamento de rejeitos da Hydro Alunorte causa danos socioambientais em Barcarena

Moradores de Barcarena denunciam poluição causada por vazamento na Hydro
www.diarioonline.com.br

Ministro do Meio Ambiente pede embargo de atividades da Hydro em Barcarena

A população da localidade não pode consumir a água que está contaminada por alumínio e mercúrio, dentre outros metais pesados

Mineradora norueguesa tinha 'duto clandestino' para lançar rejeitos em nascentes amazônicas

A empresa produtora de alumínio que é controlada pelo governo da Noruega teria usado uma "tubulação clandestina de lançamento de efluentes não tratados" em um conjunto de nascentes do rio Muripi.

Alepa apresenta relatório sobre o vazamento de rejeitos de minério em Barcarena
'É preciso decretar estado de emergência', defende o presidente da Comissão da Alepa. Laudo constatou contaminação de comunidades por rejeitos de chumbo, soda cáustica e bauxita.

Pesquisa mostra chumbo e alumínio acima do normal em Barcarena

Região, marcada por recorrentes crimes ambientais, enfrenta nova tragédia com a contaminação por rejeitos de minério da empresa Hydro.

O que me motivou desde o início a este rápido e que espero seja útil levantamento foi, por meio de pesquisa simples, ter encontrado que existia a tragédia anunciada, pelo menos na contaminação das águas:

José Maurício Machado Pires; Jorge Carvalho de Lena; Carlos Cardoso Machado; Reginaldo Sérgio Pereira; Potencial poluidor de resíduo sólido da Samarco Mineração: estudo de caso da barragem de Germano; Rev. Árvore vol.27 no.3 Viçosa May/June 2003.

Notas da imprensa mostram muito das responsabilidades claras:

Samarco admite falha na barragem que causou tragédia em Mariana

Estudo contratado pela empresa aponta problemas de drenagem desde 2009 e indica que, apesar de tentativas de reparos, parte da ampliação da barragem foi feita sobre base instável




Como os rejeitos foram da barragem para o mar - papodehomem.com.br



Um problema que é basicamente de engenharia foi a alteração do desenho de barragem, modificando sua reistência:

Mudança na barragem pode ter contribuído para desastre, diz MP

Imagens de satélite mostram alteração no projeto da barragem de Fundão. Samarco declarou que não houve mudança no eixo original do projeto.



Camilla Veras Mota; Após dois anos, impacto ambiental do desastre em Mariana ainda não é totalmente conhecido - www.bbc.com

Estêvão Bertoni, Rodolfo Almeida e Ariel Tonglet; Mariana: a gênese da tragédia; 04 de novembro de 2016 - www.nexojornal.com.br

O problema, já se sabe, é bem maior que um caso isolado e já possui histórico:

Barragens de rejeito já causaram diversas tragédias em Minas Gerais; relembre

Primeiro registro deste tipo de acidente foi em 1986, quando sete pessoas morreram em Itabirito. - www.em.com.br
Minas tem 50 barragens sem garantia de estabilidade, diz governo: veja a lista
Minas tem mais de 400 barragens de rejeitos e quase 10% delas apresentam riscos, indica o Ministério Público. Ameaça recai sobre comunidades e fontes de abastecimento de água


MP de Minas chama atenção para risco de rompimento de barragens e lança campanha
Próximo de completar dois anos do desastre de Mariana, devido ao estouro de uma barragem de rejeito de minério, promotora diz que pelo menos outros 37 reservatórios oferecem risco

A tragédia já era anunciada:
ESTÊVÃO BERTONI; Barragem da Samarco já tinha defeitos em 2009, diz relatório

O relacionado fenômeno chamado na engenharia de barragens “piping”:

Piping in Embankment Dams - research.engineering.ucdavis.edu

Tradução com acréscimos:
“Os solos podem ser eroídos pela água corrente. A erosão pode ser subterrânea se houver cavidades, rachaduras na rocha ou outras aberturas suficientemente grandes para que as partículas do solo possam ser lavadas nelsa e transportadas, sendo afastadas pela infiltração de água. Então, este tipo de erosão subterrânea progride e cria um caminho aberto para o fluxo, o que é chamado de "piping" (com certa liberdade, “formação de tubos”) A prevenção do fenômeno de “piping” é uma consideração primordial no projeto de barragens seguras.”
ANA vê alto risco em 24 barragens do País; a de Minas era bem avaliada

Barragem do Fundão era considerada de baixo risco, com probabilidade pequena de acidente; especialistas afirmam que as estruturas são planejadas para evitar catástrofes ambientais, mas reforço não quer dizer que sejam fiscalizadas
      
Rafael Italiani e Rene Moreira - brasil.estadao.com.br

Destacamos:

"O outro motivo, segundo o especialista, é a erosão interna. De acordo com uma comissão internacional que estuda e monitora grandes barragens, a International Commission on Large Dams (Icold), essa erosão causa um efeito chamado “piping”, que remete a tubos. Isso acontece quando os resíduos da mineração não têm a vazão adequada, causando furos na estrutura da barragem, até o deslizamento da terra."

Trabalho teórico no campo:

Pedro Guilherme De Lara; Metodologia probabilística de previsão de brecha de ruptura de barragens - www.researchgate.net



Bom artigo na trivial Wikipedia:

Rompimento de barragem em Mariana - pt.wikipedia.org

Erosão interna e piping na Wikipedia:

Internal erosion - en.wikipedia.org


Sugestões de documentações mais completas sobre o incidente:

Ana Paula Pereira; GESTÃO DE RESÍDUOS: O CASO DAS BARRAGENS DA SAMARCO - www.inovarse.org


Bruno Milanez Cristiana Losekann organizadores; Desastre no Vale do Rio Doce - Antecedentes, impactos e ações sobre a destruição -  www.global.org.br

Nos nossos arquivos: [ Desastre no Vale do Rio Doce ]

RELATÓRIO DE ANÁLISE DE ACIDENTE ROMPIMENTO DA BARRAGEM DE REJEITOS FUNDÃO EM MARIANA - MG - ABRIL 2016 - ftp.medicina.ufmg.br


terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Pequenas notas ambientais - 4


Metano de vacas e flatulências de argumentos


Ouvi entrevista na CBN com pesquisadores que apontam que a bovino-cultura brasileira não é um problema quando trata-se de emissão de GEE.



Imagem do vídeo “Mata de Eucalipto 7 anos” - YouTube


Resumo dos erros que percebi na argumentação:


1

Coisa triste ver ditas autoridades em gases de efeito estufa dizerem q a emissão de bois diminui quando o boi é abatido mais cedo.

Esclarecendo mais o ponto: 

Como se ao crescer, até com diferentes taxas de ganho de peso (!), a produção não se aproximasse de uma óbvia média, e havendo uma taxa de bois alimentando-se (uma população) não produzisse uma taxa de emissões, que portanto, não é propriamente dependente e proporcional ao boi (indivíduo) e quanto ele vive.


2

O boi durando menos é substituído, logo não é sua vida, mas sua taxa e população.

Citemos:

“A idade para o abate varia de 18 meses até os 4 anos para um bovino ser considerado gado de corte . A partir dessa idade, a carne do nelore vai ficando cada vez mais barata por causa da diminuição da qualidade da mesma. Por isso, é aconselhável para o pecuarista a venda desse animal a partir dessa idade.” - www.fazendasantanna.com.br

De onde, entre 8 bois durando 1,5 anos (18 meses), o que resulta 12 “bois-anos”, produzem aproximadamente mesma massa de metano que 3 bois durando 4 anos, os mesmo 12 “bois-ano”.


3

Triste também é colocarem que o pasto absorve, pois entra na taxa dos animais, pois é consumido e não há fixação.


Nota: O enorme volume de C (carbono) fixo em florestas, mesmo que temporariamente* não é prejudicado pela formação de pasto, basicamente gramíneas?

*Pois só a erosão e a sedimentação, realmente, fixa o carbono em seus “esconderijos”.


4

Triste o plantio de eucaliptos com gado. Vida curta da árvore, absorção de água, competitiva, não nativa e pouca fixação de carbono. 

Ataque-se um problema desde o primeiro momento: as folhas de eucalipto são inadequadas ao consumo de bovinos. (Em contrapartida, e adiante entender-se-á este ponto, a tóxica “jurema-negra”, nativa do nordeste pode ser consumida em até 25% em peso da ração de caprinos.)


Destaque-se, os coalas, entre os mamíferos, não os únicos animais a se adaptarem a consumir o eucalipto, e tal é tão complexo, devido à toxicidade das folhas que as crias dos coalas primeiro alimentam-se das fezes das mães até terem suficiente flora bacteriana apta a digerir as folhas.



"O eucalipto vem da Austrália, onde tem quem coma as suas folhas. Mas em Portugal não existem Koalas!" - Bucólico Anónimo


É de se discutir se todas as variedades de eucalipto tornam o terreno ao seu redor tóxico por secreção de substâncias. Aliás, eu não posso sequer afirmar que exista uma única espécie que o faça. Mas o que é certo, igualmente para os pinheiros de reflorestamento no sul do país e em certas altitudes de São Paulo (Pinus elliottii), é que estas árvores de ambiente extremamente competitivo pois carente de recursos (a aridez australiana e as proximidades do círculo polar ártico) levam as plantas a produzirem, pela perda de folhas, uma certa dificuldade do solo ser ocupado por outras plantas.

Para perceber-se isso, basta visitar um reflorestamento e observar o solo, tão diferente da abundância de vegetação de uma Mata Atlântica ou de uma mata de araucárias, repletas especialmente de samambaias e bromélias específicas de cada bioma.


Apêndice

Pontos que me foram questionados pelas redes sociais:

A1

“Se preocuparam apenas com a competição pela luz... Não seria fixação de nitrogênio?”

Definitivamente, entenda-se que emissão de metano sempre resulta em dióxido de carbono CO2 pela oxidação atmosférica (com certa ação de combustões diversas e ultravioleta solar). Ao fim, obtem-se o mesmo resultado o mesmo.

A2

“Sou quase que obrigado a perguntar:
Qual a solução pra isso, porque a população está crescendo e pessoas comem....?”


Plantar árvores nativas, biocarvão que absorve CO2 e preparar o mundo para cortar a marcha rumo à tragédia malthusiana (posição neomalthusiana, que ainda tenho que devidamente explicar).

Sempre sugiro como exemplo básico de reflorestamento na Mata Atlântica o Guanandi:


Referências e recomendações de leitura


Destaquemos:

“O manejo intenso dos eucaliptos e as substâncias químicas que resultam da decomposição das folhas acabam modificando o ambiente, impedindo que a floresta nativa se recupere.”

  • DESERTO VERDE- Os impactos do cultivo de eucalipto e pinus no Brasil; Repórter Brasil – Organização de Comunicação e Projetos Sociais, 2011. reporterbrasil.org.br   ( Nos nossos arquivos: Caderno deserto verde )

Destaquemos:

“Uma das questões mais controversas envolvendo o setor diz respeito aos impactos ambientais gerados pelos plantios de eucalipto e pinus, sobretudo, às avaliações de que essas árvores exóticas consomem muita água e contribuem para a diminuição do fluxo de de rios e córregos – e até para a seca completa. O setor empresarial defende a atividade de “florestas plantadas” como ambientalmente correta e enumera pontos positivos, como a alta taxa de sequestro de gás carbônico (um dos vilões do aquecimento global) e a restauração de áreas degradadas, principalmente, por pastagens. Também considera um verdadeiro mito as acusações de que o eucalipto consome muita água e contribui para a degradação das fontes hídricas.

Por outro lado, ambientalistas e entidades de luta pela terra preferem chamar as plantações de “deserto verde” e sustentam que as monoculturas não podem ser consideradas “florestas”, devido à pequena biodiversidade em seu interior. Apoiados nos conhecimentos de comunidades tradicionais e de pequenos agricultores, essas entidades defendem o ponto de vista de que as plantações podem, sim, gerar drásticos impactos hidrológicos.”


  • Guanandi surge como opção para reflorestamento com madeira de lei - g1.globo.com


quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Pequenas notas ambientais - 3



A nacional marcha da insensatez ambiental


Monitoramento aponta aumento de 57,7% no desmatamento da Mata Atlântica
Dado compara períodos de destruição da mata entre 2014-2015 e 2015-2016.
Levantamento é do Inpe e da ONG SOS Mata Atlântica. - g1.globo.com



Evolução do desmatamento:


Desmatamento da Mata Atlântica (km²)


Ranking 2015-2016
Estado
2014-2015
2015-2016
Variação
BA
39,97
122,88
207%
MG
77,02
74,1
-4%
PR
19,88
34,53
74%
PI
29,26
31,25
7%
SC
5,98
8,46
41%
SP
0,45
6,98
1462%
ES
1,53
3,3
116%
MS
2,63
2,65
1%
RS
1,6
2,45
53%
10º
SE
3,63
1,6
-56%
11º
GO
0,34
1,49
345%
12º
RJ
0,27
0,37
37%
13º
PB
0,11
0,32
206%
14º
PE
1,36
0,16
-88%
15º
AL
0,04
0,11
181%
16º
CE
0,03
0,09
149%
17º
RN
0,23
-

TOTAIS

184,33
290,75
0,577
Fonte: Inpe e SOS Mata Atlântica

Em planilha: Desmatamento da Mata Atlântica 2014-2016 - docs.google.com

Gráfico comparativo